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terça-feira, 7 de novembro de 2017



É preciso viver, é preciso experimentar. É a experiência que abre a consciência.

Para Jung, o pai da psicologia transpessoal e criador da psicologia analítica, é necessário desconfiar de uma sabedoria que não é fruto da reflexão e da maturidade obtida pelos próprios esforços.
Baseado nessa premissa de Jung, trazemos hoje aqui nesta coluna um profissional da aviação que tem grande parte da sua vida dedicada aos estudos sobre sistemas de aeronaves, em especial aos componentes eletrônicos e aviônicos e que, sem sombra de dúvidas, se debruçou por horas, dias, semanas e até meses em análises para buscar soluções para a manutenção, modificação e reparos em aeronaves. Estamos falando do nosso amigo Engº Eduardo Correa, que por anos trabalhou como engenheiro de manutenção em grandes empresas da aviação Brasileira.
                                                                                                                                                
Prezado Eduardo, antes de mais nada gostaríamos de agradecer por sua disponibilidade em nos contar um pouco da sua trajetória na aviação.  Com certeza, sua experiência que será aqui compartilhada servirá de estímulo para aqueles que continuam na aviação e para aqueles que pretendem iniciar uma carreira ou estão iniciando neste meio. 

Eduardo, gostaríamos que você iniciasse fazendo uma breve apresentação da sua pessoa e nos contando  como iniciou sua carreira.

Eduardo: - Meu nome é Eduardo Pires Correa. Sou Engenheiro Eletrônico, com Pós-graduação em Administração Empresarial e desenvolvi uma sólida carreira na área de manutenção como Supervisor de Manutenção de Aeronaves, ao longo destes 43 anos de profissão. Também atuei como Gerente em outras áreas produtivas, como Inspeção, Engenharia e Suporte ao Cliente, contribuindo para resultados relevantes da empresa. Iniciei a minha carreira em 1974, como Auxiliar de Serviços de Engenharia na empresa Serviços Aéreos Cruzeiro do Sul. Em 1977 fui promovido a Engenheiro, onde era responsável pela manutenção preventiva e corretiva das aeronaves, bem como na elaboração de ordens de Engenharia, as quais eram utilizadas para modificações dos sistemas das aeronaves, a fim de torná-los mais eficientes. Neste mesmo ano me casei, sendo que a minha primeira filha nasceu em 1978.

Priemeiro desafio: O Extraordinário Caravelle

Blog: - Eduardo, no início da década de 80  houve a junção da Cruzeiro com a Varig. A partir daí como foi sua história?

Eduardo:  - Em 1980, fomos comprados pela VARIG e fui convocado para realizar um curso de familiarização da aeronave A300 na fábrica em Toulouse-França. Fiquei lá por 3 meses. No final de 1980, nasceu a minha segunda filha. Fiz diversos cursos nas fábricas da Boeing, MC Douglas e fabricantes de componentes nos EUA. Em 1999 implantamos o sistema de qualidade e efetuamos treinamento de qualidade total para gerentes, ministrado pela Fundação Christiano Otoni, ligada a UFMG. Neste mesmo ano fui convidado a ocupar o cargo de Gerente da Inspeção. Com a implantação da Qualidade Total, criamos índices de Controle na Manutenção, bem como a Força Tarefa 1, que monitorava os atrasos técnicos de voo das aeronaves.


                          PP-CLA : Primeira Aeronave Airbus A300 na Antiga Cruzeiro

Blog: - Por falar em Força Tarefa-1, que foi um trabalho que teve origem com a implantação da filosofia de Qualidade Total na Varig, nos explique um pouco mais sobre como funcionava e quais os resultados obtidos.

Eduardo: - Era uma equipe onde tínhamos um coordenador para cada frota de aeronaves  e eu era o coordenador da frota MD-11, bem como acumulava a função de coordenador geral da FT1.
Quando implantamos essa ferramenta, a situação da frota  MD11, por exemplo, tinha muitos relatórios de atrasos técnicos e nossa missão era tentar reduzir o número de atrasos com o menor custo possível. Utilizamos  então o grupo de engenheiros para mapear as causas dos atrasos e fizemos várias modificações que surtiram efeitos positivos, mas ainda não estávamos satisfeitos.
Durante as análises que fizemos, descobrimos um item que estava contribuindo para que ocorressem os atrasos. Descobrimos que havia um gap no treinamento dos mecânicos de Guarulhos. Também notamos que havia vários atrasos de voo no horário próximo das 18:00, quando havia troca de turno

             DC-10: O pioneiro com instalação do sistema de anticolisão TCAS II na década de 90 

Blog: - Muito interessante. Isso demonstra que ao separarmos um tempo exclusivo para analisarmos os problemas sobre uma ótica mais macro ou micro, dependendo do que seja,  encontramos soluções que antes não eram percebidas. E a partir dessa descoberta, o que foi feito?

Eduardo: - A partir dessa análise, comprometi-me a realizar um treinamento para os mecânicos, bem como adequamos a escala aos horários de voo. Resultado,: conseguimos ser a segunda empresa no mundo em pontualidade, perdendo apenas para a KOREAN, sendo inclusive reconhecido pelo fabricante da aeronave.
 
Blog: -Realmente parece ter sido uma grande conquista não só para a equipe e para a empresa ,mas creio que também tenha sido no campo pessoal como profissional de aviação, não foi?  

Eduardo: - Esta conquista me deu o prêmio de gerente do ano 2000 da VARIG, sendo premiado com um relógio e um troféu. Prêmios simbólicos, mas que me deram grande satisfação pelo reconhecimento ao trabalho realizado.

Blog: - Muito legal. Quando a empresa reconhece o esforço do profissional isso sem dúvida é um grande fator motivacional. Você poderia nos contar mais sobre  sua carreira?

Eduardo: -  Sim, claro.  Além disso, participei do aceite técnico de 15 aeronaves MD-11 ao redor do mundo. Nesta missão, pude aprimorar a competência de negociação lidando com diversas culturas diferentes. Durante o recebimento de uma aeronave em Jacarta, tive o seguinte cenário:  Os três motores da aeronave não atendiam as condições de contrato e não possuíamos motores de reserva disponíveis para substituição.  Tive que pensar rápido para dar uma solução , pois precisávamos trazer a aeronave para o Brasil. Entrei em contato com a nossa oficina de motores no Rio de Janeiro e montamos um cronograma de revisão dos motores em nossas oficinas. Resultado: a proposta foi aceita e conseguimos um montante de 8,5M de dólares em serviços para a nossa empresa. 


              Eduardo agachado no centro em foto com a turma do curso de B737 na Boeing

Blog: - Grande! Além de resolver uma situação de imediato ainda conseguiu um bom negócio para a empresa. Mas acredito que não tenha parado por aí, correto?

Eduardo: - Em 2001 participei de um recrutamento interno para a gerência de engenharia, sendo escolhido para o cargo. Em 2002, terminei o meu curso de pós-graduação em Administração Empresarial. Mais tarde, a VARIG criou uma empresa de manutenção chamada VEM (VARIG ENGINEERING AND MAINTENANCE), a qual se dedicou também a efetuar a manutenção de aeronaves de terceiros. Fui convidado a assumir o cargo de Gerente de Suporte ao Cliente, onde pude organizar o meu staff e infraestrutura. Fiquei neste cargo até 2009, quando saí da empresa.
 
Blog: - Após sua saída da VEM você continuou atuando na aviação?

Eduardo: - Meu último desafio foi na LASA Prospecções. Lá, assumi o cargo de Supervisor de Manutenção, onde gerenciava o Suprimento, compra de material, documentação das aeronaves, plano de manutenção, mecânicos e hangar. Era responsável pela manutenção dos equipamentos de suporte ao hangar, planejava e acompanhava as tarefas de manutenção preventiva e corretiva, atuava no plano de manutenção, a fim de adequá-lo a realidade da empresa, cumpria o programa de QSMS, uma vez que éramos uma empresa ISO 9000,14000 e 18000. Aplicava os índices de desempenho da qualidade da manutenção, focando na melhoria contínua, realizava auditorias internas e externas e avaliação e qualificação de fornecedores. Nessa posição, liderei o projeto de certificação da Oficina junto à ANAC, para execução de inspeções na seção quente dos motores. Liderei também o projeto de alteração do plano de manutenção dos atuadores de freio e da revisão dos motores.

Blog: -E no momento, você ainda está ligado a aviação? Quais suas perspectivas para o mercado da aviação nos próximos 10 anos?

Eduardo: - No momento estou em busca de recolocação, pois embora esteja no grupo dos com mais de 50 anos, ainda tenho muito a oferecer e aprender. Quanto ao mercado, vejo com bons olhos a construção de hangares de Manutenção por parte da AA e TAM em Guarulhos.
 
Blog: - Que conselho você daria para os engenheiros que estão iniciando a carreira na aviação ou que pretendem entrar nessa área?

Eduardo: - Quem entra neste mercado é porque tem paixão pela aviação. Como falam, a aviação é uma “cachaça” que, depois de experimentada, não se quer largar. Sinto a falta da escolinha de formação de mecânicos que tínhamos na CRUZEIRO, onde o garoto entrava com 14 anos, a fim de aprender a profissão. Formei muitos mecânicos e Engenheiros ao longo da minha carreira, que hoje estão espalhados em outras organizações. Sinto-me orgulhoso por ter participado e colaborado com a Manutenção da VARIG, que, até hoje, é reconhecida como uma das melhores.

Agradecemos  ao Eduardo por ter nos concedido esta entrevista e por nos agraciar com um pouco da sua história. Acreditamos que essa pequena parte da história contada pelo Eduardo faça parte de um imenso acervo da nossa aviação brasileira e nos é apresentada como exemplo para olharmos o futuro sem esquecermos do passado. É preciso aprendermos com o que já houve de melhor na aviação  como as empresas VARIG e CRUZEIRO e inovar a aviação atual . 

Se você também faz parte da história da aviação e quer compartilhar um pouco da sua experiência conosco, envie um email para josefernandesinst@gmail.com  que lhe passaremos melhores detalhes de como participar do AviationExperience.

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